Sentados ao redor de uma mesa num fim de semana chuvoso, quatro amigos são líderes mundiais e com suas decisões e um par de dados, movem exércitos e conquistam outros países. Outros, são grandes capitalistas, comprando, vendendo e alugando propriedades. Ou ainda, senhores feudais, reunindo recursos para construir aldeias e estradas. O jogo de tabuleiro é uma ferramenta poderosa de simulação. As regras e mecânicas estabelecem uma série de pressupostos que servem como palco de especulação para os jogadores. Os exemplos citados aqui, War, Banco Imobiliário e Colonizadores de Catan, abstraem o território da maneira que convém ao recorte estabelecido pelo jogo, cada um à sua maneira. O que têm em comum é uma lógica expansionista, acumuladora e competitiva. O tabuleiro, as peças e as regras do jogo vêm impregnadas de uma visão de mundo. Sua formulação é essencialmente política e seu exercício traz uma série de valores intrínsecos, independente dos jogadores encararem aquele momento apenas como um passatempo despretensioso.
Durante o trabalho desse semestre, intentamos produzir um jogo de tabuleiro que simule a construção do território de uma maneira mais ampla. A principal ferramenta para isso é a narrativa. Ao propor maneiras de contar histórias sobre lugares e suas transformações abrimos mão da competição como motor do jogo. O interesse é uma boa história, coesa e coletiva. O tabuleiro e as peças são abstraídos o suficiente para dar maior liberdade narrativa; as regras de interação entre as peças servem para ajudar na condução dessas histórias. O turno de cada jogador funciona em duas etapas: um momento de leitura do tabuleiro-território e uma ação, um projeto, que deve ser justificado com uma narrativa coerente com o todo.
Elaboramos o tabuleiro, as peças e o conjunto de regras. Esse texto não se pretende um manual de instruções. A ideia é traçar um panorama de nossas intenções e imaginar a dinâmica geral. O jogo nunca começa com o tabuleiro vazio, não existe tábula rasa. As pré-existências, diferentes a cada partida, são ganchos para as primeiras jogadas.
As peças são cinco: sujeito, recurso, barreira, conexão e acontecimento. Cada uma tem um formato e uma propriedade diferente. Ao posicionar uma peça no tabuleiro, o jogador conta uma história relacionando a peça que colocou com as peças adjacentes. Independente da narrativa, a propriedade daquele novo elemento segue valendo.
A peça de sujeito, por exemplo, pode ser um castelo, uma cidade, uma casa, um bairro, uma tribo indígena. É o ponto de vista da história e precisa estar próxima a uma peça de recurso. Essa, por sua vez, é empilhável, e pode ser um rio, uma mina, uma floresta, uma usina hidrelétrica, uma universidade. A barreira separa duas narrativas, a conexão aproxima e ambas também tem que ser definidas no momento em que são jogadas. A peça de acontecimento permite aos narradores acrescentarem ou retirarem outras peças, dependendo da história que contam. Ao fim de cada jogada, os outros jogadores podem acrescentar fatos novos à narrativa que acabou de ser elaborada. Ao dizer apenas “e” ou “mas”, não podem negar o que foi dito, mas posicionar uma nova peça adjacente e continuar aquela história. No fim do turno, quando cada jogador tiver feito sua jogada, o tabuleiro manda uma mensagem: uma carta com os objetivos coletivos para a rodada seguinte, e a penalidade referente ao não cumprimento do que é proposto. Em grupo, os jogadores decidem a história que justifica os efeitos práticos da carta.
A construção do território é algo bastante complexo e não temos a pretensão de resolver todos os seus pormenores. Mas sabemos que é um processo que acontece no tempo, resultado de sucessivas contribuições de agentes diferentes, criando um ambiente multifacetado, diverso, muitas vezes com incompatibilidades e incongruências. Os interesses de cada um dos atores é diverso, os pontos de vista e as possibilidades materiais de realização também. Ao usar a narrativa coletiva como tônica, tentamos trazer isso à tona, fazendo com que os jogadores experimentem processos de produção de território, usando referências que já têm e pensando possibilidades novas, exercitando a negociação e a criatividade.
Grupo 25: Ana Clara Marin, Laura Tomiatti, Lívia Volpato, Luiz Felipe Orlando, Vitor Hugo Pissaia
Orientadora: Marina Grinover