A Mesa Redonda Arte, Pesquisa e Política, realizada no dia 20 de maio de 2017 no Campus Guarulhos da UNIFESP, foi uma das Atividades Públicas no âmbito do projeto Contracondutas, que contou com a presença do professor e pesquisador do Instituto de Arquitetura e Urbanismo da USP de São Carlos Fábio Lopes de Souza Santos, que integra o Núcleo de Estudos das Espacialidades Contemporâneas (NEC), um dos envolvidos nas Intervenções Públicas do Contracondutas, com o projeto GRU-111: Contracartografias.
A mediação foi realizada pelo professor do departamento de História da Arte da UNIFESP Pedro Fiori Arantes, possibilitando uma articulação fundamental para o debate, já que sua pesquisa se insere sobre as transformações na forma e nos processos produtivos na arquitetura contemporânea. Atualmente, desenvolve um projeto de pesquisa sobre as narrativas visuais e cidade contemporânea, práticas artísticas e ativismo urbano. Nesse sentido, a mesa articulou as diversas relações entre Cultura, Arte, Arquitetura, Cidade, Política, Imagem e Contemporaneidade, através de um posicionamento crítico que compreende não apenas a pesquisa, mas modos de fazer.
Esta atividade integra um conjunto de Atividades Públicas elaboradas em parceria com a UNIFESP, como forma de fomentar o debate público sobre as principais questões que norteiam o projeto Contracondutas.
Tratou-se de uma oportunidade singular para que todos os envolvidos conhecessem o trabalho desenvolvido pelo NEC, que passa não só pela pesquisa, mas pelos modos de fazer, através da ação e do desenvolvimento de projetos que refletem as transformações espaciais contemporâneas da cidade em suas diversas camadas culturais, artísticas, sociais e políticas. Ou seja, através das inter-relações entre arquitetura, arte, cidade e sociedade são elaborados diversos projetos que permitem leituras urbanas experimentais, através de pesquisas, reflexões e ações por meio das espacialidades contemporâneas.
Foram apresentadas as diversas pesquisas desenvolvidas pelos membros do NEC, permitindo elucidar as questões aos participantes, e com isso tangenciar um debate em esfera pública para esclarecimentos sobre os principais objetivos do projeto e as correlações mais amplas que se decorrem com a sociedade, discutindo e refletindo como estes temas estão presentes em nosso cotidiano nas mais diferentes camadas, como indivíduo inserido em sociedade, em um espaço social como a cidade, ou como trabalhador e consumidor dentro do funcionamento das lógicas operacionais do sistema capitalista.
O debate que partiu das discussões sobre as diversas camadas circunscritas no Aeroporto Internacional de Guarulhos como um objeto-ícone do contexto contemporâneo de mercadificação e globalização, que atravessa as mais diversas questões que permeiam esse espaço, buscando compreender a lógica que se insere entre o visível e o invisível, aquilo que é mostrado e o que é ocultado, a lógica do sistema que gerencia e disciplina os fluxos, os corpos, a mercadoria, a informação e etc., ou seja, as diversas camadas operacionais das lógicas de funcionamento do espaço aeroportuário. Com isso, são investigadas as correlações mais amplas que circundam esse espaço, através da arquitetura, trabalho, turismo, comportamento, infraestrutura, financeirização, público e privado, migrações, comércio interacional, luxo, precarização, desejos, exploração, controle, dentre outros.
Dentre os diversos assuntos tratados, a questão do impacto do Aeroporto Internacional de Guarulhos na cidade foi um dos que permearam toda a discussão, buscando compreender o que acontece com a chegada e posteriormente a expansão do Aeroporto com seu entorno, a população do distrito de Cumbica, que em sua maioria eram trabalhadores advindos de fluxos migratórios, principalmente do nordeste do Brasil para trabalhar exatamente não só nas obras do Aeroporto, mas nas grandes obras de infraestrutura que aconteciam no contexto da cidade nos anos de 1970-80. O resultado apresentado é que esses trabalhadores, que em grande medida vieram para o trabalho, acabaram construindo suas vidas nesse entorno que atualmente abriga grande parte dos 4,5 mil funcionários de uma das maiores construtoras do país, responsável pela ampliação do Aeroporto. Dentre eles, os 111 trabalhadores resgatados de condições análogas às de escravos, segundo fiscalização do Ministério do Trabalho.
Essa foi a constatação verificada para iniciar o trabalho do NEC, o Projeto GRU-111: Contracartografias, que buscou, sobretudo, compreender aspectos da complexa estrutura econômica, social, cultural e tecnológica que permitiu a ocorrência de tal fato, transportando essas questões para operar na chave do discurso e da imagem no desenvolvimento de contracartografias. Foi esse o resultado apresentado na exposição coletiva “Diagrama Contracondutas” na Escola da Cidade, trabalhos coletivos desenvolvido pelos diversos participantes do NEC/IAU-USP de São Carlos que busca conferir visibilidade às relações de trabalho e econômicas que atravessam a dinâmica aeroportuária.
Uma gama complexa de contracartografias, modos de correlação e espacialização da informação, operando como diagramas infográficos que oferecem diversas informações visuais sobre essas diversas camadas operadas na lógica de funcionamento do espaço aeroportuário, sobretudo, no que se refere à construção do Terminal 3 do Aeroporto. Uma interpretação visual e gráfica que permite a ativação, compreensão e a tomada de posições críticas.
Esse debate, altamente profícuo despertou o interesse dos participantes, pois foi possível compreender, por fim, que a existência de trabalho análogo a escravo, compreende um universo muito mais complexo de variáveis presentes no contexto atual de todo trabalhador. Ou seja, dar visibilidade ao que mostra-se oculto, através das lógicas operacionais presentes em praticamente todas as grandes obras de infraestrutura, e porque não, em todo a lógica operacional do sistema capitalista.
Uma atividade pública se pretende direcionada ao debate e reflexão pública do tema, pois deve avançar do trabalho desenvolvido pelas intervenções em suas produções culturais, para atingir o público nas relações sociais nas quais estão inseridos.