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21.06.2017

Ministério Público Do Trabalho: Combate À Escravidão E À Exploração Infantil

Rodrigo Bonciani

crédito da imagem: http://escravonempensar.org.br/

Entrevista com a Procuradora Elisiane dos Santos

Na história do Trabalho escravo, a exploração infantil foi uma constante. Quando o tráfico de escravos na África Centro-Ocidental – principalmente no Congo e Angola – se tornou mais intenso do que o da Guiné – atuais Benim, Nigéria, Gana, Togo, Libéria –, na passagem do século XVI para o XVII, aumentou exponencialmente o tráfico de crianças e adolescentes. Daí que a palavra moleque, derive do quimbundo muleke, que significa menino, garoto, assim como as palavras do quicongo minleeke e do umbundo anleeke; o adjetivo nleku, em quicongo e quimbundo, significa travesso, divertido; todas essas línguas são da África Centro-Ocidental. Um dos primeiros dicionários de português, o de Raphael Bluteau, define o verbete moleque assim: “veio-nos esta palavra do Brasil e vale tanto como pequeno escravo negro”, revelando a transformação da palavra no contexto do escravismo atlântico.

Atualmente, segundo pesquisas do IBGE feitas em 2009 e 2011, existem 3,6 milhões de trabalhadores entre 10 e 17 anos. O combate à exploração do trabalho infantil é uma luta nacional e internacional, que visa superar a lógica da exploração econômica que se sobrepõe à dignidade humana e o costume de aceitação do trabalho de menores ainda presente em nossa sociedade.

Elisiane dos Santos, Procuradora do Ministério Público do Trabalho, nos fala mais sobre esse problema contemporâneo.

Qual sua trajetória profissional e como você foi se dedicar aos temas do trabalho análogo à escravidão e da exploração do trabalho infantil?

Eu ingressei na área jurídica no ano 1992, fazendo estágio em escritório de advocacia. De lá para cá, sempre atuei na área jurídica, fui servidora do Tribunal Regional do Trabalho (1994-1999), advocacia privada (2000-2006) e em novembro de 2006 ingressei no Ministério Público do Trabalho. Antes de iniciar a carreira de Procuradora, já tinha contato com movimentos sociais e movimentos de advogados populares, que atuavam no enfrentamento do Trabalho escravo e infantil no Brasil. A partir do meu ingresso no MPT, passei a ter contado direto com as realidades perversas que envolvem esse mundo sombrio do trabalho, podendo atuar mais diretamente no seu enfrentamento. Fui lotada em Boa Vista/RR, Itabuna/BA, Osasco/RR e finalmente em São Paulo/SP. Em todas essas regiões há diferentes formas de exploração de homens, mulheres e crianças no trabalho. Ainda há muito que se lutar para avançar no campo dos direitos humanos nas relações de trabalho. Lamentavelmente alguns setores da sociedade ainda priorizam a exploração econômica em prejuízo ao trabalho digno, em condições humanas.

Como o Ministério Público do Trabalho atua no combate à essas formas de exploração?

Nós atuamos de forma repressiva, mas também preventiva. A forma tradicional de atuação se dá nas investigações instauradas a partir de denúncias, ou seja, por provocação. Todavia, nos últimos anos o MPT tem desenvolvido diversos projetos, buscando uma atuação promocional e preventiva, independentemente da denúncia sobre determinado fato. O Projeto Resgate a Infância é uma experiência relevante no combate ao trabalho infantil. A partir do mapeamento dos municípios com os piores índices de trabalho infantil, atua-se no sentido de exigir a efetivação de políticas públicas de enfrentamento ao trabalho infantil; convoca-se as empresas locais, em audiências públicas, para cumprimento da Lei da Aprendizagem; e reunimos com a comunidade escolar, para trabalhar a questão junto as crianças e famílias, numa perspectiva de reconhecimento de direitos e libertação de uma condição de opressão, com vistas ao exercício da cidadania.

Além disso, o MPT participa de fóruns, comissões, comitês que discutem estratégias de enfrentamento ao trabalho infantil e escravo, com vistas a estabelecer diretrizes e compromissos dos diferentes órgãos e instituições na produção de pesquisa, realização de campanhas, mobilização social, acompanhamentos de projetos legislativos que afetem estas matérias, com vistas a articulações necessárias.

No campo repressivo, é importante destacar as forças-tarefas que são realizadas com diferentes órgãos parceiros, com o resgate de trabalhadores escravizados e regularização das condutas através de Termo de Ajuste de Conduta (TAC) ou Ação Civil Pública (ACP).

Como você analisa a legislação brasileira, em diálogo com as convenções internacionais, em relação ao combate do Trabalho escravo, ao Tráfico de pessoas e ao trabalho infantil?

Penso que a legislação brasileira avançou nesses dois temas. Em relação ao Trabalho escravo, com a consideração do trabalho degradante e jornada exaustiva como tipologias ou modalidades daquele. O Trabalho escravo contemporâneo não pode ser reduzido a ausência de liberdade do trabalhador, haja vista que a dignidade humana é valor maior de todo o sistema jurídico, sob o qual se assenta o Estado Democrático de Direito. Portanto, tratar o trabalhador como coisa, reduzi-lo a condição de ser inferior, sem dignidade, é uma espécie de escravidão, porque o trabalhador não consegue se libertar daquela condição. Ele está aprisionado, vulnerável aos mandos e imposições do empregador-explorador.

A legislação da infância também é bastante avançada no sentido de assegurar constituicionalmente a proteção integral e prioridade absoluta da criança e do adolescente, trazendo a tríplice responsabilidade da família, Estado e sociedade na defesa dos seus direitos. Além disso, o Estatuto da Criança e do Adolescente traz muitas conquistas e inovações ao prever um Sistema de Garantia de Direitos que deve atuar em rede na proteção e defesa dos direitos da criança, assim como prevê tipos penais específicos para crimes praticados contra crianças, como abuso e exploração sexual comercial.

É preocupante a tentativa de retrocesso social, a partir de diversos projetos legislativos em tramitação no Congresso Nacional, buscando modificar o conceito de Trabalho escravo, bem como reduzir a idade mínima para o trabalho, sem contar nos outros projetos gerais de terceirização e reforma trabalhistas, que trazem impactos diretos nas relações de trabalho, e poderão agravar a situação de exploração de trabalhadores adultos e crianças, em condições precárias e degradantes.

No Brasil, quais setores produtivos fazem uso mais frequente do trabalho análogo à escravidão e do trabalho infantil?

Diferentes setores se utilizam do trabalho infantil nas cadeias produtivas, rural e urbano, sendo que a última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) aponta uma incidência maior do trabalho em atividades urbanas. Destaca-se uma amplitude do trabalho infantil no setor informal, no comércio, indústria e setor de serviços. Além disso, trabalho em atividades ilícitas, como no tráfico de drogas e a exploração sexual comercial são existentes e de difícil combate. Também o trabalho infantil doméstico ainda ocorre em todo o Brasil e, ultimamente, pode-se visualizar uma incidência grande de trabalho nas ruas das grandes cidades (ambulantes, malabares, engraxates, rodinho).

Você acompanhou o caso de condenação do Brasil por Trabalho escravo na Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) no fim do ano passado? Como analisa o evento? Acredita que ele terá consequências importantes para o combate ao Trabalho escravo e ao Tráfico de pessoas no Brasil?

Acredito que seja uma decisão de altíssima relevância para avançarmos na responsabilidade empresarial decorrente da violação de direitos humanos nas cadeias produtivas. Adotando-se as diretrizes dos princípios sobre Empresas e Direitos Humanos há o dever de prevenir, mitigar e reparar o dano. Tais ações são exigíveis tanto em relação ao empresariado, quanto em relação ao poder público, que não podem ser omissos a ponto de tolerar ou permitir, ainda que indiretamente, a exploração do trabalho infantil e escravo no desenvolvimento de suas atividades. A condenação também ocorre em razão da exploração do trabalho infantil. É uma decisão importante, paradigma no tocante à responsabilização dos participantes, ainda que indiretamente, nos resultados que levaram a violações de direitos fundamentais.

Quais são os meios mais importantes para o combate do trabalho análogo ao de escravo e o do trabalho infantil? E quais são as maiores dificuldades dessa luta?

A fiscalização do Ministério do Trabalho e atuação investigatória do MPT são fundamentais no enfrentamento das duas questões. Além disso, ações voltadas a inserção dos trabalhadores resgatados em programas sociais, profissionalização e qualificação, assim como o desenvolvimento de novas políticas sociais na área da infância, que possa proporcionar autonomia às famílias e emancipação, como cultura de direitos humanos e não políticas assistencialistas são essenciais para uma mudança de fundo, que venha efetivamente a trazer uma nova perspectiva de vida e trabalho digno para esses trabalhadores e infância para as crianças.

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