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31.05.2017

Dinheiro sujo

André Mesquita

Mark Lombardi. George W. Bush, Harken Energy and Jackson Stephens c. 1979-90 (5th Version), 1999.

“Uma série de tendências e desenvolvimentos recentes, da internet ao NAFTA, até uma única moeda europeia, parecem pressagiar o futuro da cultura de um mundo ‘sem fronteiras.’ As fronteiras nacionais, algumas inalteradas durante séculos, foram erguidas inicialmente para separar e delimitar pessoas, lugares e sociedades. Mas, na era da informação, elas tornaram-se, segundo dizem, totalmente obsoletas. Um impedimento ao comércio justo e um inconveniente para os viajantes, uma barreira à cooperação e compreensão entre os povos, uma ferramenta nas mãos de déspotas pregando de tudo, desde xenofobia ao racismo homicida absoluto. Talvez fosse melhor um mundo sem fronteiras políticas, [mas] a ausência de controles internacionais pode também ter outras consequências imprevistas. Um bom exemplo disso é o crescimento das operações bancárias offshore e a indústria do dinheiro sujo.

Dinheiro sujo pode ser definido como caixa pronto ou patrimônio líquido cujas origens e propriedades foram intencionalmente obscurecidas. Este é o dinheiro que foi limpo e esterilizado, lavado através de um vasto labirinto internacional de salas de telex, contas bancárias codificadas, fundações anônimas e empresas de fachada. Uma vez que encontre refúgio, digamos, na Suíça, Hong Kong ou Panamá, os ativos são supostamente (mas nem sempre) salvos dos olhares dos funcionários fiscais estrangeiros, polícia e tribunais, e qualquer outro que possa reivindicar um percentual ou interesse nos fundos.

Há muitas razões pelas quais alguém queira valer-se de tais serviços. Talvez a razão mais antiga seja o medo de apreensão ou confisco em tempos de guerra, distúrbios civis ou instabilidade política […]. De longe, o motivo mais comum é a evasão fiscal […], que desde os primeiros dias da indústria de dinheiro ‘apátrido’, tem experimentado uma taxa de crescimento fenomenal. Centenas de bancos internacionais, companhias financeiras, consultores fiscais, advogados, agentes, mensageiros e corretores (alguns baseados nos Estados Unidos e outros no exterior) suprem o comércio em expansão […]. A maior parte deste crescimento é atribuído, naturalmente, ao dinheiro sujo gerado por um mercado de US$ 200 bilhões anuais em drogas ilegais. Desse montante, ao menos metade dele recebe algum tipo de lavagem a cada ano, antes de ressurgir mais uma vez em ‘investimentos legítimos.’ Os mesmos canais financeiros utilizados para processar o dinheiro da droga também podem ser usados para cometer outros tipos de crimes. Entidades offshore já tornaram-se uma espécie de marco valorizado para uma cultura cada vez mais descarada de colarinhos brancos e tecno-bandidos que trabalham para saquear ativos corporativos e desviar recursos bancários, cometer fraudes de valores mobiliários, lavagem de propinas comerciais e facilitar o suborno, ocultar ativos dos credores, criar abrigos fiscais falsos e alterar contas para aperfeiçoar seus demonstrativos financeiros antes de uma venda. Em outras palavras, eles cozinham os livros e se envolvem em qualquer tipo de esquema imaginável com a intenção de fraudar ou enganar, se não um cobrador de impostos ou regulador bancário, dependendo das circunstâncias, talvez um de seus próprios parceiros, acionistas, auditores, cônjuges ou parentes […].

O gasoduto offshore também pode ser utilizado pelos governos para cumprir atividades militares, políticas e de inteligência secretas. Virtualmente, qualquer nação na Terra possui algum tipo de serviço de inteligência ou a capacidade de, entre outras coisas, conduzir atividades clandestinas e às vezes ilegais em várias partes do mundo. Operações secretas incluem atos de sabotagem, intimidação e assassinato, tráfico de armas, quebra de sanções e a formação de exércitos insurgentes de guerrilha, a aquisição ou roubo de documentos classificados, o suborno de funcionários estrangeiros, acadêmicos, empresários e jornalistas, o financiamento clandestino de partidos políticos, grupos de fachada, e assim por diante. Eles são a ‘mão invisível’ de uma nação, tentando de alguma forma influenciar os eventos e as atitudes de um país estrangeiro […]. Para muitas pessoas, tudo isso é apenas um grande jogo, uma versão adulta de esconde-esconde e caça-bandeira. Mas é também um jogo extremamente disfuncional, cuja existência representa um desafio para o estado de direito, para a responsabilidade política e corporativa local e para o desenvolvimento econômico no exterior.” (pp. 86-88).

Trecho do ensaio “The ‘offshore’ phenomenon: dirty banking in a brave new world”, de Mark Lombardi. Publicado em CONLEY, Brian e NAJAFI, Sina (eds.). Cabinet Magazine: Mapping Conversations, Número 2, 2001.

Tradução: André Mesquita

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