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Pesquisa sobre trabalho e migração na construção civil

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10.09.2016

A lei da terceirização e as opiniões divergentes

Ilustração: Deborah Salles

Em 2015, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 4.330/2004, que define novas regras para a terceirização no setor privado e elimina a distinção entre atividades principais e acessórias de uma empresa. A proposta aguarda votação no Senado e é alvo de campanhas e debates – principalmente na indústria da moda, pelo impacto que pode causar em toda a cadeia produtiva. A fragmentação da cadeia produtiva, com repasse de serviços em sucessivas subcontratações, está no cerne do debate sobre precarização da mão de obra, incidência de trabalho infantil e exploração do Trabalho escravo.

Por outro lado, a queda de produtividade na indústria, a crise fiscal, a recessão e a concorrência com a Ásia trouxeram à tona a recente discussão sobre a competitividade do mercado brasileiro e a flexibilidade das relações de trabalho. A proposta da chamada Lei da Terceirização surge como resposta, mas gera intensa controvérsia entre quem teme a piora das condições de trabalho e quem defende o aumento da produtividade.

Instituições como a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) argumentam que a proposta dá mais eficiência ao setor produtivo e mantém garantias trabalhistas da CLT – recolhimento de contribuições ao INSS e fundo de garantia, férias asseguradas – no setor formal. Ainda de acordo com os defensores do projeto, a lei resolveria uma controvérsia jurídica na legislação atual.

Hoje, a Justiça do Trabalho permite apenas a transferência de atividades que não façam parte do negócio principal da empresa. Segundo o assessor econômico da Fiesp, André Rebelo, muitas empresas não terceirizam atividades porque há insegurança jurídica sobre esse tema no Brasil. “Em geral, [a lei] é mais eficiente. Isso permite a formação de empresas ultraespecializadas”, ele afirma. O problema, para os representantes da indústria, é que não há clareza em como definir essas atividades.

Para entidades como o Ministério Púbico do Trabalho (MPT), o Grupo de Trabalho de Empresas e Direitos Humanos da ONU, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e representantes do Ministério do Trabalho e Previdência Social (MTPS), o projeto de lei da terceirização viola a proteção constitucional ao trabalhador. Eles rejeitam o argumento de que a proteção da CLT se mantém para os terceirizados na nova lei, pois, na prática, é o segmento que concentra a maior parte das violações de direitos humanos e trabalhistas. A proteção aos direitos humanos é um tema que antecede a Lei da Terceirização e que, todavia, não foi equacionado.

Segundo estatística divulgada pelo Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait), 82% dos casos de trabalho análogo à escravidão encontrados de 1995 a 2015 no Brasil envolvem trabalhadores terceirizados. O trabalhador terceirizado trabalha, em média, de sete a dez horas a mais por semana, em relação a funcionários contratados, de acordo com o MPT. “Nesse universo de terceirizadas, encontramos uma incidência altíssima de acidentes de trabalho, inclusive com morte. São inúmeras situações em que as terceirizadas desaparecem, deixando os trabalhadores sem receber absolutamente nada”, conta a Procuradora do MPT, Elisiane dos Santos. Para ela, as regras que regulam a terceirização atualmente devem ser preservadas para evitar maiores violações de direitos.

Por outro lado, o PL 4.330/2004 obriga o contratante a fiscalizar se as obrigações trabalhistas são cumpridas pela empresa terceirizada. As fiscalizações de órgãos vinculados ao MTPS sobre a cadeia produtiva também deixam claro que a produção fracionada transfere para o domicílio parte de sua célula produtiva, onde o pagamento com base na produção pode levar a jornadas excessivas, sem as condições básicas de segurança e saúde. É necessário um debate sério para que, na prática, a perda de direitos por parte dos trabalhadores não ocorra, pois a precarização das condições de trabalho não é justificável pelo aumento de produtividade e competitividade da economia nacional.

Posicionamento da Câmara da Construção Civil

Os empresários da construção civil acompanham com atenção a tramitação do Projeto de Lei da Câmara (PLC 30/2015), que regulamenta a terceirização, e defendem o seu ‘aperfeiçoamento’. A proposta está sob exame do Senado Federal. Dirigentes e empresários do setor apontam como de grande importância a manutenção de dispositivo que permita a subcontratação como ferramenta de gestão. “A subcontratação é essencial no nosso setor e seria um retrocesso não tê-la aprovada no Senado. O setor é totalmente a favor que exista a subcontratação independente de qual seja o assunto”, diz o presidente da Comissão de Política e Relações do Trabalho (CPRT) da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Roberto Sérgio Ferreira. Para a CBIC, a aprovação do projeto poderá estimular a formalização da mão de obra em vários setores da economia e, consequentemente, aumentar a arrecadação.

Na construção civil, que tem características específicas que a diferem dos demais setores da indústria nacional, a subcontratação das empresas prestadoras de serviços é um processo irreversível para a organização produtiva de sua atividade, que requer trabalhadores especializados e tem subcontratados nas mais variadas etapas da obra, como eletricista, azulejista e pintor. “O setor não pratica terceirização de suas atividades, mas avalia que, com a subcontratação, ganha o setor produtivo, porque contrata empresa especializada para atuar em uma determinada etapa da construção, melhorando em qualidade, produtividade, aumento da competitividade e diminuição dos custos. O trabalhador também ganha ao ser admitido por uma empresa especializada que prestará serviços para outras construtoras, garantindo assim o seu emprego.”

Critérios da Justiça do Trabalho e a responsabilização pela cadeia produtiva

São diversas as condenações pelo Judiciário de corporações envolvidas em condições de trabalho análogas à escravidão. A Justiça do Trabalho tem considerado a capacidade econômica das empresas ao decidir que deveriam zelar pela retidão de toda sua cadeia de suprimentos.

O Grupo de Direitos Humanos e Empresas da Fundação Getúlio Vargas (GDHeE) analisou 18 decisões de tribunais superiores brasileiros sobre a responsabilidade solidária entre empresa contratante e empresa contratada por violações de direitos humanos na cadeia produtiva. Na análise, foram identificados sete critérios de decisão: (1) se a empresa contratante é a destinatária final de toda a produção da empresa contratada (absorção total da produção); (2) se a empresa contratante é a destinatária de grande parte da produção da empresa contratada (absorção parcial da produção); (3) a capacidade de fiscalização das subsidiárias pela empresa contratante; (4) a definição dos padrões e/ou métodos de produção da empresa contratada por parte da empresa contratante; (5) o poder econômico da empresa integrante da cadeia produtiva; (6) o aproveitamento do lucro econômico gerado pelo Trabalho escravo na cadeia produtiva pela empresa contratante; e (7) a identidade de sócios nas empresas da cadeia produtiva. Em todos esses casos, as empresas foram responsabilizadas por violações aos direitos humanos ocorridas em seus fornecedores, mesmo sem existir vínculo empregatício entre a empresa responsabilizada e os trabalhadores. Nas decisões, considerou-se a complexidade dos negócios e a capacidade econômica da empresa como razão para assumir que seria capaz de exercer fiscalização (incluindo due diligence).

Este texto foi editado a partir do relatório Trabalho escravo e Violação de Direitos nas Grande Obras, fornecido pela Papel Social.1

Notas de Rodapé

  1. http://www.papelsocial.com.br/

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