Esta editoria parte de uma pesquisa que revela os novos e persistentes problemas na apropriação corporativa da terra e da água. A partir da perspectiva dos trabalhadores rurais, o estudo analisa as práticas e as esperanças das comunidades agrárias,as quais são diretamente afetadas por esses problemas e dependem do acesso à terra e à água para garantir suas subsistências.
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15.08.2017
TERRA, ÁGUA E ENERGIA: a luta para permanecer no território do Assentamento Maria Cícera das Neves em Vila Propício/Goiás/Brasil
Por .Maxlanio Dias Sousa, Marcelo Rodrigues Mendonça
A luta política e o trabalho de um assentado da reforma agrária no Brasil não se encerram e não diminuem com a conquista de um pedaço de terra para plantar, produzir e viver do território de vida conquistado. O caminho a ser percorrido é geralmente muito longo entre a mobilização para ocupar os latifúndios que não cumprem a função social até a total autonomia para plantar, colher e exercer as atividades produtivas que permitem a permanência das novas unidades produtivas familiares nos Assentamentos. Tendo como ponto de partida o conhecimento dessas realidades contraditórias no espaço agrário brasileiro, esse artigo se propõe a discutir os entraves vivenciados por parte das famílias do Projeto de Assentamento Maria Cícera das Neves no município de Vila Propício em Goiás, sujeitos que estão cotidianamente condicionados a sobreviver na terra, enfrentando as dificuldades de acesso à água e a energia. Nossas análises se originaram a partir de uma pesquisa de campo (Figura 01) que compôs a programação do IV Workshop Produção e Apropriação de Fontes Energéticas: efeitos, conflitos e alternativas que aconteceu entre os dias 24 e 27 de outubro de 2016 no Instituto de Estudos Sócio-Ambientais na Universidade Federal de Goiás, organizado a partir de parcerias entre A UFG e o Grupo de Estudos TRAPPU – Território, Trabalho e Políticas Públicas - http://ufgtrappu.wixsite.com/trappu - e pesquisadores vinculados a universidades no Reino Unido, precisamente a University of Strachclyde em Glasgow, na Escócia. As atividades forma financiadas pela FAPEG - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás - http://www.fapeg.go.gov.br/, British Council e Newton Fund (Reino Unido) e Engineering and Physical Sciences Research Council (EPSRC, Reino Unido). -
04.08.2017
USINA HIDRELÉTRICA DE SANTO ANTÔNIO DO JARI: efeitos socioespaciais na Comunidade Tradicional do Iratapuru, sul do Amapá/Amazônia/Brasil
Por Karoline Fernandes Siqueira Campos
O artigo retrata parcela das atividades desenvolvidas numa pesquisa exploratória, através dos trabalhos de campo guiados pelos procedimentos metodológicos num diálogo entre a Geografia e a Etnografia, realizados na Comunidade de São Francisco do Iratapuru/AP, localizada na Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Amapá, região sul do Estado do Amapá (Figura 1). O objetivo foi verificar e compreender os efeitos socioespaciais da implantação da Usina Hidrelétrica (UHE) de Santo Antônio do Jari e as alterações nos usos do território após a expulsão dos ribeirinhos de seus lugares de vida para a construção do barramento no rio Jari e a construção da nova Comunidade, conhecida pelos moradores como Nova Vila. A tendência de preservação na região Amazônica, através da Secretaria Estadual de Meio Ambiente, criou em dezembro de 1997, através da Lei - 0392 - 11/12/1997, a Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Rio Iratapuru (RDS-I) numa área de 806.184 ha, sendo ampliados para 1.000.000 de hectares. Sua área abrange os municípios de Laranjal do Jari, Mazagão, Pedra Branca do Amaparí, na região sul do Estado do Amapá. A RDS-I do Iratapuru foi uma das primeiras, constituídas no Brasil, que se utiliza do aproveitamento socioambiental de maneira a conservar as riquezas da floresta (OLIVEIRA, 2012). Ainda sobre a criação da RDS-I, Vilhena (2004), afirma que a Comunidade de Iratapuru é a guardiã, usuária e beneficiária da reserva do rio Iratapuru, cuja principal exploração da reserva é a castanha (Bertholletia excelsa), além de outros produtos florestais como copaíba, resina do breu branco (Protium heptaphyllum) etc. Esse beneficiamento é gerenciado por um Conselho de Gestão, que compreende associações e cooperativas de produtores. -
01.08.2017
TRABALHO ANÁLOGO À ESCRAVIDÃO NA CAFEICULTURA DO PLANALTO DA CONQUISTA, BAHIA
Por Aurelane Alves Santana, Marco Antonio Mitidiero Junior
O Planalto da Conquista, na Bahia (figura 1), importante região produtora de café desde o início da década de 1970, começou a sofrer, a partir dos anos de 1990, intenso processo de precarização da força de trabalho e redução significativa do número de pessoal ocupado no campo. Nesse período, as alterações pelas quais passaram as relações laborais na cafeicultura corresponderam exatamente ao momento em que houve o avanço das formas de exploração do trabalho incorporadas pelo capital em sua fase de mundialização. Além disso, marcou a instauração de uma nova expressão do trabalho degradante na atividade cafeeira sob o aspecto da escravidão contemporânea, o que deprimiu ainda mais os níveis de reprodução da vida dos trabalhadores. Ante a esse contexto, faz-se necessário considerar, em âmbito geral, que os avanços tecnológicos, organizacionais e sócios metabólicos estabelecidos pelo capital em seu momento de crise provocaram graves alterações no interior da classe trabalhadora, flexibilizando e desregulamentando as relações de trabalho. No que se refere à conjuntura laboral rural conquistense, os impactos desse processo sobre os trabalhadores começaram a ser percebido de maneira mais expressiva no início dos anos 2000, sobretudo a partir de 2013, quando houve o incremento do uso de máquinas agrícolas especializadas em todas as fases do processo produtivo do café e, consequentemente, a ampliação da precarização do trabalho e do desemprego. -
21.07.2017
O CERRADO GOIANO NUMA ENCRUZILHADA DE TEMPOS: OS TERRITÓRIOS EM DISPUTA E AS NOVAS TERRITORIALIDADES
Por Marcelo Rodrigues Mendonça
As discussões sobre o Cerrado goiano (Figura 01) – uma das áreas de maior produção/produtividade agropecuárias do mundo e um hotspot de sociobiodiversidade – está ameaçado de destruição pelas formas de uso e exploração da terra e da água, intensificadas nas últimas décadas pelo agrohidronegócio. Essa proposta decorre de uma análise bibliográfica, de pesquisas de campo e de reflexões em congressos científicos e similares. Essas atividades conduziram a seguinte síntese: o Cerrado enquanto bioma, ao ser apropriado pelos diferentes protagonistas (Comunidades tradicionais, grupos econômicos nacionais e transnacionais, Estado e distintos sujeitos), se constitui em territórios em disputa. Disputas entre as diversas formas de uso, entre as diferentes interpretações/linguagens e disputas para assegurar quinhões de pesquisa, sejam materiais e/ou imateriais. Assim, propomos colocar em discussão as leituras geográficas sobre o Cerrado, os conflitos decorrentes das formas de uso da terra e da água e as múltiplas territorialidades construídas. Várias pesquisas realizadas com interfaces entre os saberes geográficos, antropológicos, biológicos, pedagógicos e de outras ordens têm sido o objeto de esforço de pesquisadores envolvidos com atividades da graduação e da pós-graduação na Universidade Federal de Goiás. Essas pesquisas recuperam análises enunciadas por Almeida (2005), compreendendo o Cerrado a partir de diversas abordagens, tais como: bioma; ecossistema; região de incorporação ao capital; território; paisagem; mito; cultura; expressão de formas de vida cerradeiras etc. -
18.07.2017
Novos sentidos do trabalho entre o campo e a periferia urbana (2): entrevista com Jotalune Dias dos Santos (JS), presidente da Federação dos Trabalhadores Rurais Assalariados de São Paulo (FERAPESP)*.
Por Brian Garvey, Juan Toro
Jotalune Dias dos Santos Nasci no Piauí, no nordeste do Brasil e mudei para São Paulo quando eu tinha seis anos. Estava cortando cana de açúcar no interior de São Paulo aos 15 anos, como um trabalhador migrante. Eu deixei o campo por um tempo, mas voltei. Fiz parte do movimento para apresentar um novo sindicalismo na região em 2001. Lembro que, em 2006, os usineiros introduziram a jornada de trabalho com escala de cinco dias de trabalho e um dia de folga, o que significava que não havia mais o final de semana em família para muitos trabalhadores. Imagina, uma família, a mãe, o pai e os filhos que trabalhavam na roça, o único momento de ficar juntos estava na plantação, não em casa, porque cada um teria um dia de folga diferente. Então conversamos com os trabalhadores, viajamos para diversas frentes da lavoura, mas as pessoas tiveram medo de lutar, medo de perder o emprego. Não houve uma greve na região em muitos anos. Tentamos negociar com os donos, mas eles não ouviram. Então, um por um, os trabalhadores entraram em greve na região. Não conseguimos acompanhá-los. Viajamos 300 km para um lugar para explicar que o proprietário estava mentindo, já que o mesmo dizia não haver greve, mas não tinha sido cancelada, a greve. A escala de cinco dias de trabalho e um de descanso foi abolida. Mas, vimos como o 100% dos trabalhadores foram demitidos dentro de 45 dias passada a greve. E as máquinas entraram. Eu tive que aguentar isso. -
18.07.2017
Novos sentidos do trabalho entre o campo e a periferia urbana (1): entrevista com Seumas MacInnon e Tam McGarvie, da Galgael, Escócia*.
Por Brian Garvey, Juan Toro
Seumas MacInnon: Meu avô costumava começar suas manhãs em sua bicicleta, ele pedalava por 60 milhas (100 km). Ele vivia em uma choupana durante toda a semana e retornava aos sábados para ver sua família. Então, ele partia aos domingos à noite para ir ao trabalho. Já o pessoal da minha esposa, eles costumavam acordar às 4 horas da manhã e andar seis milhas (10 km) até a entrada da mina, fazer o turno do dia e andar as seis milhas de volta. O que eu estou dizendo é que, como em outros trabalhos agrícolas aqui ou no Brasil, é algo universal, os patrões têm explorado os trabalhadores. Eles vão à um “novo” país e o colonizam. Você vê quase o mesmo padrão. E a ganância dos homens não conhece limites. De forma que o emprego dos trabalhadores assalariados vem através dos auspícios do contratante que age como: “vou lhe dar uma miséria”. Ambos Colin (MacLeod, membro fundador da organização) e eu, trabalhávamos quando jovens para a prefeitura, mas o fato é que a gente sentia que a gente estava... eu acho que sentíamos que o trabalho não fazia sentido. Você mencionou a palavra “sentido”, mas sentido vem de uma crença. O fato sobre Galgael é que se você acredita no que você está fazendo. Toda sua percepção muda de alguma forma porque você acredita em algo. O incentivo não é o dinheiro, não é em ganhos. É algo diferente. É algo sincero. Você é quase coração e alma. Você está colocando seu coração e alma nesse projeto. E foi isso o que começou Galgael. O sentido não é sobre todos se tornarem individualmente ricos, mas se tornarem enriquecidos pelas percepções comunitárias e culturais. Você sente que é como acreditar novamente. -
26.06.2017
Trabalho precário e terceirização na economia verde do século XXI
Por Brian Garvey, Maria Joseli Barreto
Dois ônibus de transporte rural, distinguíveis pelo pó vermelho grudado em seus painéis amarelos e às rodas desgastadas, saem de uma padaria que abre às 5 da manhã para que os remanescentes ‘boias frias’ – cortadores de cana – da cidade de Assis possam levar café e pão para as extensas fileiras dos canaviais. Eles passam pelo bairro de São Francisco, cujas ruas foram nomeadas em homenagem aos 23 cortadores de cana mortos tragicamente nos anos 80 nessa rota de ônibus da região oeste de São Paulo. Pai de três filhos, Luis, prende seus protetores de canela e ajeita a faca no corredor de cana-de-açúcar designado a ele, pelo qual será pago por metro cortado; dois engenheiros da empresa voam para o Canadá para aperfeiçoar as técnicas de produção de celulose cuidadosamente guardadas. As máquinas de colheita que estão rapidamente substituindo trabalhadores que, como Luis, operaram durante a noite, e seus motoristas trocam de turno para garantir o ciclo contínuo. Sete caminhões de transporte duplos já aguardam na estrada vermelha para transportar o açúcar e o etanol para as lojas e postos, bombas e portos em expansão no Brasil. Um falcão faz um voo rasante sobre um animal morto na estrada. Além da atividade matinal do engenho e da destilaria, nada mais se move na paisagem, dominada por quilômetros de cana de açúcar balançando em direção ao sol, já forte no céu sem nuvens. Esses elementos que captam nosso olhar de forma tão dramática nessa parte oeste do estado de São Paulo, a luz solar, a abundância de terras férteis, a água ao longo do vale do Paranapanema, e a disponibilidade de mão-de-obra, vindas de ônibus das cidades vizinhas ou penduradas nas cabines dos caminhões, têm sido aproveitados por fortes interesses estatais e corporativos cada vez mais envolvidos com o capital internacional para lançar o Brasil no cenário internacional como um dos principais exportadores agrícolas e de biocombustíveis com comparativa vantagem entre as dez commodities mais comumente negociadas no mundo. -
26.06.2017
Terra, trabalho, alimentos e energia renovável
Por Brian Garvey, Francis Vinicius Portes Virginio, Russell Pepper
Os assentamentos de reforma agrária no Brasil são aqueles nos quais os trabalhadores rurais conseguiram ocupar e obter o direito a trabalhar na terra que eles vivem agora. Sua existência é a prova extraordinária da resiliência dos trabalhadores rurais ou sem-terra no Brasil e sua determinação para que a terra estivesse disponível ‘para aqueles que trabalham nela’. A ausência de apoio político, financeiro e técnico a esses assentamentos, entretanto, significa que a situação dessas pessoas é frequentemente precária e a ambição coletiva de sustentar a produção alimentícia nessas comunidades é frustrada. O Brasil, assim como muitos outros países, tem um sistema energético centralizado e fortemente dependente de massivos projetos petrolíferos, hidroelétricos e, mais recentemente, bioenergéticos. Isso significa que, frequentemente, comunidades rurais, em virtude de sua localização ou “invisibilidade” perante às decisões e investimentos governamentais (mais uma vez, um fenômeno global), não estão conectadas às redes elétricas ou estão destinando grande parte de seus recursos financeiros para pagar pela energia elétrica. Dessa forma, os residentes dessas comunidades rurais e em terras ocupadas, tem de, constantemente, queimar madeira para cozinhar e aquecer a água. Algo que coloca pressão ainda maior sob seus recursos escassos ou os torna dependentes de custosos e poluidores geradores de energia (gasolina/diesel). Essas práticas têm oferecido sérias implicações para o meio ambiente local e saúde dessas pessoas. Ainda assim, muitas famílias não conseguem arcar com esses custos e vivem sem acesso apropriado à energia. Além disso, mesmo quando conectadas à rede nacional de energia, as comunidades, dependentes de agricultura em pequena escala, são pressionadas pelos altos custos da energia elétrica. Sendo assim, os gastos financeiros para obtenção de energia é um elemento diferencial entre abastecimento de água para uso doméstico ou para aumento da produção da plantação local. -
14.06.2017
Agrotóxicos no agronegócio brasileiro: a sujeira por trás da “energia limpa ”
Por Brian Garvey, Larissa Mies Bombardi
O Brasil se tornou, sobretudo na última década, em um grande exportador de commodities de origem agrícola/agropecuária e também de agrocombustível. Dentre as commodities, destaca-se que o país é o primeiro exportador mundial de açúcar, carne bovina, carne de frango, café, suco de laranja e tabaco e, também o segundo maior exportador de milho e soja (alternando com os EUA o primeiro lugar). O país é ainda o maior exportador de etanol (produzido a partir da cana-de-açúcar), embora este agrocombustível não seja considerado commodity. Dentre os 12 primeiros produtos com maior participação no total das exportações brasileiras, tivemos: soja, açúcar, carne de frango, farelo de soja, milho em grão, carne bovina, celulose e café em grão. Ou seja, 8 dentre os 12 produtos mais exportados pelo Brasil (em % do valor total das exportações) são produtos agropecuários, sendo que a soja ocupa o segundo lugar em nossa pauta de exportação, após o minério de ferro. Os produtos básicos representaram, em 2014, praticamente 50% do total das exportações brasileiras[note]www.mdic.gov.br. Acesso em Março de 2015.[/note]. Os mapas apresentados a seguir retratam o aumento dos cultivos de cana-de-açúcar e soja no Brasil e, também, sua expansão em direção à região Centro-Oeste do país. Esta grande expansão de tais cultivos tem sido feita com uso massivo de agroquímicos. De acordo com o IBAMA (Ministério do Meio Ambiente, 2009) a soja ocupa o primeiro lugar como destino do total das vendas de agrotóxicos no país (47,1%), o milho ocupa o segundo lugar (11,4%) e a cana (8,2%) ocupa o terceiro lugar. -
07.06.2017
Petrificação e (Re)Existência: A defesa camponesa da biodiversidade
Por Brian Garvey, Edevaldo Aparecido Souza, Marcelo Rodrigues Mendonça
A captura de recursos corporativos em escala global tem sido alimentada por políticas transnacionais favoráveis e acesso a finanças internacionais e agora ocorre com uma taxa e uma escala sem precedentes. Este artigo que foca a produção multinacional de açúcar e etanol no estado de Goiás contrasta essas dinâmicas com a construção lenta da comunidade e os consequentes confrontos com os sistemas de valores sociais e culturais das populações nas novas fronteiras da produção da agrohidroindústria. No estado de Goiás, as tecnologias de solo, plantação e energia e os desenvolvimentos logísticos põe os pioneiros em contato com a economia verde mais uma vez, os grupos de comunidades indígenas, camponesas e tradicionais afrodescendentes que sobreviveram em terras marginais e remotas desde os primeiros empreendimentos coloniais (ver Porto-Gonçalves, 2006). A necessidade do capital de expandir-se por essas terras planas e iluminadas pelo sol e sua exigência de trabalho submisso significa necessariamente a restrição e subjugação dessas comunidades cuja existência e uso territorial associado estão em conflito com suas monoculturas. Aqui, afirmarmos que a "petrificação" desses sujeitos rurais é uma condição necessária para a continuidade da vantagem competitiva das corporações e uma série de alavancas persuasivas e coercitivas são empregadas para reforçar ou aprofundar esses diferenciais de poder. No entanto, conforme apresentamos a seguir, a resiliência e a resistência dessas comunidades determinadas a permanecer na terra e '(Re)existir' chama nossa atenção para novas práticas de organização, trabalho e produção diversificada de alimentos que se contrapõe à lógica das empresas transnacionais desafiando seus territórios. -
31.05.2017
A reinvenção do arcaico? Notas introdutórias sobre a exploração do trabalho haitiano no Brasil
Por Francis Vinicius Portes Virginio
O propósito deste artigo é analisar algumas das principais características e formas de exploração dos haitianos no trabalho no Brasil. Os últimos anos foram marcados pela chegada de mais de 75.000 imigrantes haitianos ao país. A imigração começou após o terremoto de 2010 no Haiti, no qual mais de 250.000 pessoas morreram e o país foi completamente destruído. Os haitianos rapidamente constituíram o maior contingente de imigrantes no mercado de trabalho brasileiro. Naturalmente, um número crescente de estudos tem analisado esse fenômeno social e indicado intensas formas de exploração do trabalho desses imigrantes (Magalhães e Baeninger, 2016; Mamed e De Lima, 2015). Este artigo busca contribuir para essas discussões ao explorar o nexo da participação haitianos com as transformações no mercado de trabalho brasileiro nos últimos anos. Apesar de seu caráter introdutório, este artigo permite entrever algumas das dimensões formais e informais da subordinação e exploração do trabalho haitiano no Brasil. O artigo contribui para a temática proposta nessa série apresentando flagrantes contradições entre o ideal de modernização das relações trabalhistas e práticas arcaicas de exploração desses imigrantes nos setores do agronegócio e da construção civil. Dessa forma, ele oferece evidências empíricas de como as estratégias de valorização do capital, pela modernização e desregulação desses setores, estão intrinsicamente associadas ao aumento da exploração do trabalho, sendo a inclusão do trabalho haitiano uma oportunidade de satisfação das mesmas. -
29.05.2017
PRODUÇÃO DE ENERGIA HIDRELÉTRICA NA AMAZÔNIA E O TRABALHO DEGRADADO
Por José Alves
A Amazônia brasileira, historicamente, tem sido uma região de intensos processos de apropriação de suas riquezas naturais pelo capital nacional e internacional, gerando genocídio, migrações, desterritorializações e impactos nos territórios indígenas, ribeirinhos, extrativistas, camponeses e em áreas urbanas. Os grandes projetos na região têm sido a tônica da recente fase de desenvolvimento nacional, como o Complexos Hidrelétrico Madeira com as usinas hidrelétricas (UHE) de Jirau e Santo Antônio. Nossa tese de doutorado (ALVES, 2014), base para as reflexões ora apresentada, permitiu adentrar no tema da mobilidade do trabalho para estas grandes obras, compreendendo os intensos processos de exploração e degradação decorrentes das formas de organização do trabalho empregadas. O problema norteador da investigação constituiu-se em evidenciar qual o papel da Amazônia na produção de energia hidrelétrica, bem como quais mediações e formas de controle do trabalho são mantidas entre capital, trabalho e Estado para a construção desses empreendimentos. Partiu-se da hipótese de que as revoltas de trabalhadores ocorridas na UHE de Jirau, nos anos de 2011 e 2012, seriam a expressão territorial da neobarbárie evidenciada com o projeto do “Novo Desenvolvimentismo”, via o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), de (re)incorporação da Amazônia como a nova/velha fronteira hidroelétrica. Sob esse recorte espaço-temporal, a análise foca os processos de mercantilização da natureza, via corpos hídricos, em recursos para a geração de energia hidrelétrica transmutando-os em territórios do hidronegócio-energético, bem como, no intenso mecanismo de precarização do trabalho na fase de construção dos grandes empreendimentos barrageiros. O desvendamento das tramas de relações que constituem a base de produção do espaço, da mobilidade do trabalho e do capital, da superexploração e degradação do trabalho são ancoradas na pesquisa qualitativa e na Geografia do trabalho. -
28.05.2017
TRABALHO, TERRA E GLOBALIZAÇÃO
Por Brian Garvey
Esta série de artigos se dedica à convergência de três aspectos fundamentais da economia capitalista global e sua relação com o trabalho tanto na área rural quanto na urbana. O primeiro desses aspectos é o fato geralmente reconhecido de que o capital contemporâneo é menos constrangido por limites impostos pelo espaço, pela geografia e pelo tempo do que em períodos anteriores. Sendo a lealdade das empresas do século XXI, antes de mais nada e principalmente, para com seus acionistas, a capacidade de "fazer as malas e ir embora de repente" é uma moeda de troca forte usada para obter concessões do estado e, especialmente, do trabalho organizado. Além disso, as decisões das empresas multinacionais do século XXI de operar em uma escala global de que seus predecessores coloniais sequer poderiam imaginar, são tomadas em outros países ou continentes, distantes do ponto da produção. Isso aumentou dramaticamente a assimetria de poder entre o capital e o único componente do processo produtivo com capacidade de protestar, resistir ou interrompê-lo: o trabalho. Em segundo lugar, os rápidos avanços da tecnologia aceleraram a substituição das tarefas manuais por máquinas, facilitaram modelos de produção menores que reduzem a força de trabalho e a transmissão instantânea de informações através de redes virtuais permitiu que os capitalistas controlassem e coordenassem um espectro de tarefas amplamente dispersas entre forças de trabalho, quase sempre motivadas pela supressão dos custos com o trabalho.